quarta-feira, 19 de fevereiro de 2014

A saga do livro pela metade

Vamos falar sobre os livros deixados pela metade e suas razões. Não gosto de abandonar livros, principalmente aqueles que comprei, me deixa uma sensação ruim de uma compra mal feita, tempo e dinheiro desperdiçado. Muitas vezes deixamos um livro não inteiramente lido o que é algo diferente, tentar entender porque o livro foi deixado pela metade é um exercício interessante para entender nossas manias de leitor. Alguns exemplos:

O Vermelho e o Negro – Stendhal (Penguin Classics)
Vou usar a frase que já ouvi muitos dizerem: não era a hora certa. As história muito boa, o personagem principal dos mais enigmáticos, o fundo histórico da França politicamente dividida do século XIX que eu adoro, mas... a história se arrastava e no fundo, no fundo não é questão de ‘timing’, é que talvez eu atravessasse um dos momentos preguiça de leitura que às vezes se abate sobre o mais viciado leitor: um daqueles momentos que a gente quer é assistir coisas (filmes, séries) ou navegar na internet sem compromisso: deixar a mente vagabundear. Creio que a leitura será retomada em breve. Farei uma tentativa.

Solos, improvisos e memórias musicais. – Nelson Mota (Ponto de Leitura)
Mota é lendário conhecedor da música brasileira. Eu sou fã da música geração-Gal Costa-Chico-Caetano-e-companhia-limitada. Fui atraída pelo livro. O problema que o título na capa ‘improviso’ não é à toa, o autor não segue uma história encadeada, simplesmente vai mandando umas histórias soltas enquanto acompanha sua carreira com compositor e crítico musical. Livro confuso que eu já retomei algumas vezes para ler ao acaso enquanto escutava um disco da Gal ou Maria Bethania. Não sei se vai.

Os Diários de Victor Klemperer - Victor Klamperer (Companhia das Letras)
Obra longuíssima, com este sobrevivente da segunda guerra mundial, suas auguras comentadas dia após, dia ou semana após semana. Interessantíssimo para acompanharmos bem aos poucos a escala de opressões à comunidade judaica: primeiro ele perde o emprego, depois a casa, depois o direito de sair a noite, depois o uso da estrela, os casos cada vez mais frequentes de pessoas que iam ser interrogadas pela gestapo e nunca mais voltavam... o problema é que chega um momento em que é preciso um pouco de paciência para apreciar tantos detalhes. Mas a obra, o documento em si é fantástico e a leitura será sim terminada, aos poucos, mas será.

E aí? Qual leitor não tem histórias de livros deixados para trás...

segunda-feira, 10 de fevereiro de 2014

Os trabalhadores do mar – Victor Hugo - Cosac e Naify


Ilhas do Arquipélago da Mancha. Victor Hugo nos apresenta um universo em todos os seus aspectos: religião, geografia, historia em um texto acrescentado ao início desta edição. Essa espécie de prefácio se parece muito com o começo de ‘Os Sertões’ de Euclides da Cunha (livro que este blog está a ler). Detalhes e mais detalhes sobre os rochedos, as marés, as correntes de ar. Atravessada esta parte, quando enfim começamos a história que irá se desenrolar, aí sim temos o filé mignon: Hugo nos apresentando seus personagens: Gilliatt, Deruchette, Mess Lethierry, a Durande (um barco – sim um barco é parte importante da história). É um mais fascinante que o outro. Vamos nos ater a Gilliatt. Por um episódio ao acaso, Gilliatt, nosso herói, um solitário morador da ilha, tido por muitos como uma feiticeiro, homem de habilidades e intimidade com o mar, vai sem aviso arriscar a vida até um rochedo no meio do oceano para retomar a máquina perdida do naufragado barco a vapor do senhor Lethierry, outro morador com suas excentricidades – entre elas o anti clericalismo radical. Trabalho insano o resgate da Durande, que coloca nosso herói em luta excruciante com o mar e todos os seus elementos. A recompensa? O casamento com a doce Derruchete, filha do nosso ‘Mess’ – título conquistado a duras penas por Lethierry em uma sociedade divida socialmente cujo amor vai igual para o barco e a filha, a quem promete o casamento para o ser que conseguir resgatar a Durande. O fim da história? Só lendo esta obra fantástica que muitas vezes tem seus momentos ‘os sertões’, principalmente nas descrições dos engenhos de Gilliatt no rochedo: longas e cheias de detalhes que podem cansar o leitor. Mas vale a pena: a apresentação dos personagens é fascinante e apaixonante e o final, ah meus amigos... um final que só um escritor Romântico da estirpe de Hugo poderia nos brindar. E as reviravoltas da trama? E o naufrágio da Durande causando pelo aparente homem exemplo-de-conduta capitão Clubin? Antológico mes amis!!

quarta-feira, 5 de fevereiro de 2014

Hamlet (ou tentando entender a grandeza de Shakespeare)


Já havia comentado algumas vezes minha dificuldade em gostar de Shakespeare. Já lidos do autor: Noite de Reis, A tempestade, MacBeth e Hamlet – talvez a obra mais estudada e escrutinizada da história da literatura. Li as peças com clara dificuldade para entender o que se passava e chegar às profundezas que levam a maioria dos críticos a colocar Shakespeare como o maior criador literário do ocidente. Estes dias me vi pensando mais uma vez sobre o assunto e repassando na minha cabeça o enredo de Hamlet consegui alcançar algo de uma iluminação. Talvez muita gente já houvesse percebido o fato  - e eu aqui dando uma de retardada: mas não é a genial a ideia do personagem que para vingar seu pai não pega em nenhuma arma e sai a matar cruelmente o autor do assassinato? Ao vez disso ele faz o que? Monta uma peça de teatro... uma peça dentro da peça e ali, encenando a morte do pai, ele consegue não a vingança em si, mas confirmar a culpa do assassino pela sua reação. Não é isso genial? Cheguei em casa e fui repassar algumas passagens do livro. Ganhei meu dia, consegui ter um pequeno lampejo da grandeza do bardo! Antológico!

segunda-feira, 27 de janeiro de 2014

1968 o ano que não terminou - Zuenir Ventura

A história começa com o revillon na casa de Heloísa Buarque de Holanda, a Helô. Uma festa onde aconteceu de tudo! O ano era a virada 1967-1968. A partir deste momento Zuenir Ventura vai contar através de realtos e de sua própria memória os acontecimentos da época que resultou no AI 5. Mesmo com a seriedade dos eventos não há como não se divertir com a narrativa que conta episódios corajosos, dramáticos. Um deles teve como centro a exibição da peça de José Celso Martinez "Roda Viva". Escrita por Chico Buarque, o diretor se aproveitou do fato de o público de Chico ser majoritariamente a classe média comportada e brindou a platéia com um show de horrores: "No cor­re­dor do tea­tro iniciava-se um ritual antro­po­fá­gico no qual as atri­zes repre­sen­tando fãs dis­pu­ta­vam, estra­ça­lha­vam e devo­ra­vam um fígado de boi cru, sim­bo­li­zando o cora­ção do can­tor que aca­bava de mor­rer. Não raro, aque­les que esta­vam sen­ta­dos nas pol­tro­nas do meio junto ao cor­re­dor, eram atin­gi­dos pelo san­gue ver­da­deiro que vinha do fígado, erguido pelas mãos cris­pa­das da faná­tica turba."
Este e outros episódios são contados no livro de Ventura além de todos os absurdos cometidos pelos censores. Um deles, exigiu a retirada das palavras "gorila", "vaca" e "galinha" da peça "um bonde chamado desejo" do americano Tenesse Williams. Detalhe: o nome do sensor era Leão. Estas e outras histórias, muitas delas sem este humor negro vão se seguindo em uma leitura deliciosa, esclarecedora e equilibrada pois em nenhum momento o autor parece tomar o lado de ninguém. Leitura recomendadíssima pra quem quer ler sobre este período sombrio da história brasileira. ANTOLÓGICO.

quinta-feira, 18 de julho de 2013

Notícias do Planalto - Mario Sergio Conti - Companhia das Letras (1999)


“A construção de uma imagem presidencial não era novidade”. João Figueiredo pousava para as câmeras andando a cavalo, José Sarney se apresentava como literato, Collor como o atleta sendo fotografado correndo, andando de moto, no meio da mata junto a soldados do exército. Mas nem sempre a produção saía como a encomenda. “A motocicleta que ele pilotou em Brasília, uma possante Ninja – descobriu-se em seguida – fora contrabandeada. Na Suécia Collor dirigiu um caminhão que derrapou e saiu da pista. Vestindo colete da Polícia Federal, ateou fogo numa montanha de maconha, mas o excesso de gasolina provocou uma explosão que chamuscou sua comitiva” . Estes e outros detalhes pouco conhecidos sobre Fernando Collor, a construção de sua imagem antes, durante e depois de ser eleito presidente estão contidas nas quase 700 páginas de Notícias do Planalto.
São centenas de anedotas, que Mario Sergio Conti revela no livro que pretende mostrar a relação de Collor com a imprensa. O autor nos apresenta inúmeros jornalistas dos principais jornais, revistas e emissoras de TV. Como a imprensa apoiou Collor como uma novidade e depois escancarou a corrupção que era exercida em seu governo por seu “testa de ferro” PC Farias. Não dá pra largar o livro, somos apresentados a detalhes da personalidade dos jornalistas e da própria família Collor desde o pai do “caçador de marajás”, sua carreira política e a relação pessoal com os filhos! Acompanhamos Collor em sua campanha e seus pontos cruciais como o já famoso episódio da edição do debate entre ele e Lula, fator importante para a derrota do candidato adversário: simplesmente antológico!

domingo, 5 de agosto de 2012

ho-ba-la-la, em busca de joão gilberto - companhia das letras (2011)

'Pra quê discutir com madame?'

Marc Fischer é jornalista alemão "infectado" pelo vírus da bossa nova depois que um amigo toca pra ele a quarta faixa do disco "chega de saudade" de João Gilberto, "ho-ba-la-la".

Fascinado com aquela música, ele tem um objetivo: se encontrar com o artista responsável por aquele som único. Ele vem ao Rio de Janeiro a procura de seu ídolo. O único problema é que este é um recluso dos mais extremos: João Gilberto quase nunca sai de casa, não dá entrevistas, não toca para ninguém a não ser para si mesmo - dez, doze horas por dia.

O que Fischer consegue é falar com aqueles que circularam ao redor de Gilberto: Miúcha - sua ex esposa - João Donato, Roberto Menescal e outros nomes importantes da mitológica história da música brasileira. Dessa forma ele se aproxima de João.

E agora? Nosso alemão vai conseguir realizar seu sonho? Fazer com que João Gilberto toque para ele - no próprio violão que o Marc Fischer traz ao Rio - a música "ho-ba-la-la"? Acompanhamos Fischer em suas aventuras pelo Rio, sua viagem à Diamantina onde Gilberto ficou na casa de uma irmã. Trancado dentro do banheiro com seu violão por dias, ele só sairia de lá com a "fórmula": seu estilo único que seduz gringos desavisados mundo a fora. ANTOLÓGICO.

segunda-feira, 23 de julho de 2012

persépolis (marjane satrapi); lendo lolita em teerã (azar nafisi)



Dois livros interessantes para se ter uma visão de perto sobre a Revolução Islâmica que depôs o Xá e colocou o Imã Khomeini no poder no Irã em 1979: Lendo Lolita em Teerã de Azar Nafisi (A Girafa) e Persepolis de Marjane Satrapi (Cia. Das Letras) este último uma história em quadrinhos! O relato de Nafisi mostra um grupo de alunas que se reuniram a convite da professora - Nafisi ensinava literatura inglesa na Universidade de Teerã - para discutir livros ocidentais banidos pelo guardiões da moralidade que tomaram conta da vida privada dos iranianos. Enquanto tece os relatos sobre as reuniões em sua casa, Nafisi apresenta o Irã, antes um país com costumes liberais, tomado por uma revolução que baniu a individualidade impedindo mulheres de decidirem sobre suas vidas afetivas e que por obrigação da lei deveriam usar o véu.

O relato de Satrapi também cobre estes eventos, mas de uma maneira um pouco mais bem humorada expondo o absurdo da situação onde as pessoas eram revistadas em busca de qualquer indício contra a moral ou contato com o decadente mundo ocidental (maquiagem, baralho). As duas dão um relato pessoal e sem detalhes históricos, o que não leva a uma análise técnica do período, mas apresenta o absurdo do totalitarismo seja ele de que viés ideológico ou religioso. A anulação da individualidade como meio de controle e a imposição de valores. Antológico!

Três livros e muita história: Llosa, John Boyne e Chimamanda Adichie

Dois assuntos favoritíssimos da vida: literatura e história. O primeiro eu estudei formalmente na facul, apesar de ter lacunas muitos sér...