Foi o que fiz antes de iniciar a leitura deste primeiro volume dos livros sobre o governo militar escrito pelo Elio Gaspari - autor hoje mais conhecido por ser colunista de um dos "jornalões" brasileiros. Elio tem seu arquivo historiográfico pessoal, conversou longamente com alguns dos próprios presidentes militares, como Geisel, e ganhou bolsa de estudos para pesquisar o assunto no exterior. "A Ditadura Envergonhada" cobre o período desde a movimentação dos militares que depôs o presidente João Goulart até a instituição do famigerado AI-5 que jogou o Brasil em dez longos anos de torturas, censura e abusos inomináveis.
Minha "pesquisa" consistiu em ler algumas resenhas na web. O título de um dos artigos que apareceram já logo confirmava minhas suspeitas: "a historiografia envergonhada". Ou seja, alguns dos trechos do livro de Gaspari tendiam a retratar a ditatura de um modo que nem todos possam concordar. Em outro link também li que alunos de pós-graduação em alguma universidade já haviam jogado por terra alguns argumentos de Gaspari. Como gosto de acompanhar estes tipos de discussão, paguei pra ver e encarei a leitura do livro.
Meu conhecimento em política não é substancial, mas acompanho o noticiário e costumo ler a respeito com frequência. Em casa, tive um pai que foi um político fracassado. Nunca conseguiu se eleger a nenhum cargo, mas conheceu pessoalmente gente como Tancredo Neves e Itamar Franco e isso deve ter me influenciado de algum modo a me interessar pelo assunto. Dito isso, não tenho, portanto cabedal para analisar o livro em suas inconsistências ou discutir seus trechos mais polêmicos, mas posso dar minha impressão geral para quem se interessar em lê-lo.
O livro é muito bem documentado, todas as informações tem sua fonte registrada em notas de rodapé. Descreve em detalhes os primeiros movimentos dos militares para a deposição do governo para "salvar" o Brasil do comunismo. Quando do golpe, vai se descrevendo a formação da resistência, a derrota de parlamentares ligados ao militares nas primeiras eleições pós 64 e a publicação Ato Institucional 2 que liquidou as eleições diretas para presidente. Um dos melhores capítulos do livro, no entanto, é a análise do contexto cultural que o autor faz dos anos sessenta, uma década em que a juventude inquieta girava a roda em um sentido e o discurso oficial girava em outra.
O livro é até bem escrito, mas às vezes oscila: tem trechos saborosos e outros em que ficamos perdidos em tantos detalhes (o que pode ser visto como algo bom, certamente). Pesando tudo, sou obrigada a concordar com a crítica feita pelo texto da internet: Gaspari parece olhar para o período militar sem condenar os presidentes em si e sim criticar a chamada "linha dura", a ala indisciplinada dos militares e, claro, a tortura. O presidente deposto João Goulart é mostrado como um homem sem pulso, vacilante, “sem inimigos, a não ser os da política". Os parágrafos finais deste volume contam do episódio em que militares colocam em um palco presos políticos e com ajuda de slides ensinam técnicas: "a palmatória é um unstrumento com o qual se pode bater em um homem por horas a fio, com toda a força..."